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RENATO ZUPO

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Juiz não é Deus

ENTRETANTO

Está escrito nas leis que comete crime de desacato todo aquele que desdenha do servidor público em razão de sua função (ou profissão) ou por causa dela. Os tribunais também entendem que este desacato pode ser por palavras, gestos, atitudes, e até mesmo pelo desdém. Isso mesmo: até pelo silêncio se ofende. Agora, vamos imaginar a cena já famosa no Brasil inteiro: a fiscal de trânsito para um veículo irregular e, ao interpelar o condutor, se depara com um Juiz de Direito. O que a agente de trânsito fez, e o que de fato deveria ter feito? A diferença é sutil. Identificado o magistrado, faria muito bem a moça – que ainda vai acabar em algum reality show ou posando pra revista masculina – em simplesmente multá-lo. Até aqui, seria errado o juiz, por se valer de sua condição pública para tentar se esquivar da autuação de trânsito. Mas o que de fato fez a moçoila? Quis aparecer, dar lição de moral, quis ser a rainha da cocada preta: virou para o magistrado e afirmou que ele não era Deus! E é claro que não era! O comentário pretendia, na verdade, menoscabá-lo, afirmá-lo um prepotente, algo que a fiscal de trânsito não teria o direito de fazer, tanto que acabou condenada pelo comentário em tom de chacota. Nada justifica a \”carteirada\”, mas vai aí para o leitor amigo mais uma informação (que a imprensa intencionalmente não menciona): agentes públicos tem o dever funcional de se identificar em qualquer situação de confronto ou fiscalização. A mera identificação do magistrado não o torna o rei da carteirada. O colega deveria ser multado e a fiscal deveria multá-lo sem excessos verbais. Falou demais e se deu mal.

Jeitinho.
Educação é tudo, gente. Para me identificar em situações em que sou desconhecido e preciso ser fiscalizado, adoto o critério de simplesmente apresentar meus documentos e permanecer calado e gentil. O fiscal, seja ele agente de trânsito, policial, agente aduaneiro, que cumpra a lei e pronto. Jamais tive stress com outras autoridades, porque entendo que naquele momento da abordagem, da fiscalização, a autoridade ali é ele. Eu sou, neste caso, não o magistrado, mas o cidadão contribuinte. E se estiver descumprindo a lei, que arque com as represálias e conseqüências que se fizerem necessárias aos olhos do agente público. Um colega meu, juiz, flagrado em uma blitz com documentos irregulares, se identificou para o policial militar. O que o policial lhe respondeu? Que iria multá-lo assim mesmo, porque ele como magistrado sabia que aquilo era o que a lei mandava. Viram a diferença entre este policial e a agente de trânsito do outro \”causo\”conhecido? É muito simples: o PM não queria aparecer e nem desdenhar e apenas cumpria a sua função. A outra queria tirar uma \”casquinha\” e aparecer. Havendo educação de ambos os lados tudo se resolve bem e sem escândalos e bate boca. Quando falta berço, falta pai e mãe, o atrito vira manchete sensacionalista.

Aprendendo a punir.
A multa de trânsito é, na verdade, uma modalidade de pena administrativa, assim como a retenção ou a remoção do veículo, a suspensão ou cassação da habilitação para dirigir automotores. Existe para conter e reprimir as infrações de trânsito, assim como as penas criminais existem para reprimir os delitos. Só a sua aplicação já é dura o bastante, em qualquer caso, seja a punição administrativa ou judicial, por infração de trânsito ou crime. Não há necessidade alguma de xingar, falar duro, tripudiar sobre a pessoa punida. O agente público que assim age está provocando o desacato em sentido inverso, e esse ensinamento aprendi com meu amigo o Major Reis, hoje Tenente Coronel reformado. Segundo ele, policial que aborda de maneira descortês ao infrator está praticamente forçando uma reação também rude desse cidadão, está provocando o problema e não contendo o delinqüente. Está na verdade criando uma discussão maior do que a mera desinteligência no trânsito. Dizia mais: só se dá bronca para educar, quando não se vai punir. Se há a punição, ela sozinha já é suficiente para \”puxar as orelhas\” do infrator. Ir além disso é deturpar a lei, é criar o conflito e não apaziguá-lo.

Renato Zupo,
Juiz de Direito.

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