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RENATO ZUPO

Magistrado • Escritor • Palestrante

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De fora pra dentro

ENTRETANTO

Não sei se já te explicaram sobre o caso Robinho, mas vou tentar fazer isso de maneira mais simples.

Ele teria estuprado uma mulher na Itália, ao lado de “parças” (meu Deus, como jogador de futebol gosta de andar com  puxa saco!).

Foi condenado lá na Itália e quando transitou em julgado a condenação, anos depois, já estava de volta ao Brasil.

Como Robinho é brasileiro nato, nascido aqui, nossa Constituição proíbe que seja extraditado pra cumprir pena em outro país, como no caso de Cesare Battisti (lembram-se do italiano terrorista que por aqui vivia?).

Se fosse para ser extraditado, como Battisti, o caso seria resolvido pelo nosso Ministério das Relações Exteriores e com autorização presidencial.

Como não é possível (Robinho é brasileiro nato…), o governo italiano pediu que o ex-jogador cumpra aqui a condenação estrangeira.

Aí é com o Ministério da Justiça, e com o STJ – Superior Tribunal de Justiça – e não com o Presidente da República.

E o STJ autorizou, Robinho se apresentou e já está preso em Tremembé, ao lado de criminosos famosos.

Lá é uma espécie de hall  da fama do crime: Nardoni,  Richtofen, Matsunaga, Cravinhos, só sobrenomes conhecidos das páginas policiais de nossa  História recente, todos estão ou passaram por lá.

Enfim, esta é a sina de Robinho.

 

De dentro pra fora.

A Constituição também impõe regras para que a decisão condenatória estrangeira possa ser cumprida (executada) no Brasil.

Em  primeiro lugar, o fato criminoso deve ser crime lá  e aqui, e a pena imposta compatível com a prevista na legislação nacional.

A condenação deverá estar traduzida por tradutor juramentado e percorrer os trâmites legais, Ministério da Justiça, Ministério Público, STJ…

Como no caso de Robinho, deve haver o trânsito em julgado da condenação.

A decisão não pode mais comportar recursos judiciais no país de origem.

E o condenado deve estar em condições de saúde física e mental  para cumprir a condenação, também se indagando se o devido processo legal foi seguido por lá.

O Direito Italiano  é muito parecido com o nosso, e era questão de tempo até que Robinho tivesse que cumprir o inevitável.

Poderia ter cumprido lá na Itália, e logo, com muito menos alarde, como lhe recomendou o amigo e ex-técnico de futebol Leão, segundo revelado por este em um podcast. Conselho repleto de sabedoria de gente vivida e experiente.

 

Crimes que repercutem.

Guardem também outro conselho. Se você por acaso cometer um crime de grave repercussão, Deus o livre e guarde disso, mas se acontecer da mídia te espancar por causa do fato, se você for lacrado e sofrer o que se convencionou chamar de justiçamento social, deposite  suas esperanças em uma pena justa e rápida, observado o devido processo legal.

Não tente ser absolvido. Se você já foi condenado pela  mídia e pela  opinião pública, dificilmente irá escapar da condenação judicial.

Só o tempo se encarregará disso,  se é que  o fará – como aconteceu com o técnico  Cuca.

Quando jogador do Grêmio, com passagens pela Seleção Brasileira, Cuca se meteu em  uma suruba durante jogos amistosos na Suíça.

Tudo coisa da juventude e do mundo  da  bola, sempre repleto de casos apimentados, não fosse o fato de que uma das participantes da peripécia fosse uma menina ter treze anos.

Cuca foi condenado por lá,  à revelia, e jamais retornou à Suíça – seria preso.

Passadas três décadas, contratou advogados que reverteram a condenação através de um remédio jurídico conhecido como “revisão criminal”, previsto lá e cá.

Os advogados de Cuca encontraram uma tecnicalidade descumprida à época que anulou todo o processo.

 

Revisão Criminal.

Como  disse em um julgamento a minha querida ex-professora, a Ministra Camem Lúcia, não há trânsito em julgado de decisão condenatória no Brasil, quando existente nulidade que prejudique à defesa do réu.

E ela assim concluiu com base no instituto da Revisão Criminal,  presente no Código de Processo Penal (CPP) e recepcionado e admitido em  nossa Constituição Federal.

Existindo alguma nulidade, não importa o tempo  da condenação,  não importa o crime, tampouco o trânsito em julgado, a decisão poderá ser rescindida, anulada, por meio  da revisão criminal.

Também assim  o será se surgida  prova nova da inocência do condenado.

Seria tosco e ilógico se fosse o contrário: descobrimos trinta anos depois da condenação transitar em julgado que a culpa formada não foi justa e nem correta do ponto de vista jurídico.

Todavia, nada fazemos porque já “transitou em julgado” a condenação.  Absurdo.

O que não se sabe é porque a justiça  Suíça jamais pediu ao Brasil o cumprimento da condenação de Cuca por aqui, como o governo italiano fez com Robinho.

O ex-jogador fala que está sendo vítima de racismo (besteira).

Acredito piamente que o  problema de Robinho não tem a ver com a cor da pele, mas com o fato de que seu crime foi  cometido em  uma época de intenso ativismo social, exposição midiática globalizada e patrulhamento moral – com  ênfase na proteção de “minorias”: mulheres,  LGBTQ+, imigrantes, etc…

Não fosse isso,  Robinho estaria solto, como Cuca sempre esteve.

E antes que me indaguem: Daniel Alves foi solto porque cumpriu  parte de  sua condenação aguardando preso ao julgamento – se chama detração.

E porque indenizou a vítima, o que na Espanha é requisito para a concessão de progressão de regime prisional.

 

Preso de novo!

Mauro Cid foi preso novamente. Depunha a um juiz federal auxiliar do Ministro Alexandre de Moraes a fim de confirmar dados de sua colaboração (delação) premiada.

Ao final do depoimento de mais de nove horas, foi decretada sua prisão.

Motivo: conversas vazadas de Zap,  em que criticava seus inquisidores e dizia que o país é governado pelo  Ministro Alexandre de Moraes do STF.

A decisão que “repristinou” sua prisão (repristinar: voltar a valer) se embasou no fato de que obstruía a justiça e descumpria medidas cautelares concedidas como condição da concessão de sua liberdade provisória, agora revogada.

As condições reveladas pela imprensa foram o recolhimento domiciciliar e o distanciamento de outros indiciados, exceção de seus familiares próximos, tornozeleira e abstenção  de redes sociais.

Não se revelou até aqui eventual compromisso  de não  comentar atos do processo a que responde ou proibição de utilização de telefone celular ou aplicativos de mensagens.

Aliás, estas proibições modernas, paliativos e substitutos da prisão,  são fora da  curva: me  recordo que a esposa de Sérgio  Cabral, ex-governador do Rio, foi  proibida de ter acesso  à internet!

Durante o cumprimento da medida, ela fugia de Wifi igual o  diabo foge da cruz,  e só usava telefone fixo.

Um entregador de pizza revelou à revista  Veja que na época foi fazer uma  entrega no endereço da ré, que assistia Sessão da Tarde e Vale a Pena Ver de Novo! Só assim, sem internet.

 

Vazamento  Seletivo.

Como só se revela ao público em geral aquilo que o relator do inquérito autoriza, não se sabe ao tempo desta nossa conversa se há alguma outra medida descumprida por Cid  e que justifique  sua prisão.

Por isso, sempre critiquei aqui aos inquéritos sem fim e ao vazamento seletivo de informações acobertadas por sigilo judicial.

Dos primeiros se pode dizer que tornam o  delegado o senhor do bem e do mal e o indiciado já um culpado privado de direitos mesmo sem condenação judicial.

Quanto ao vazamento,  põe e depõe no poder e do poder, influencia resultados de eleições, execra imagens e reputações conforme o fígado, o amor e humor de quem autoriza a  veiculação.

E a defesa dos investigados não tem o que fazer.

Para que não digam que estou falando de Cid e de Alexandre de Moraes, vou retroceder  no tempo aqui: o juiz Moro da Lavajato, às vésperas das  eleições presidenciais em que Dilma quase foi derrotada por Aécio Neves, autoriza veiculação de célebre conversa telefônica da então “presidenta” com Lula.

O diálogo revelou que Dilma pretendia nomear ministro de Estado o  líder maior do PT, para que Lula angariasse de novo foro por prerrogativa de função (privilegiado) e escapasse de ser preso pelo força tarefa curitibana da Lavajato. Foi estrondoso, e danoso para a seriedade do processo, o resultado político da revelação.

 

Precedente.

Não quero  crer que Cid tenha sido de novo preso, desta vez por crime de opinião ou porque criticou a seus algozes.

Quando digo “não quero”  é não quero mesmo! Não que não seja isso.

Se a decisão  tiver este fundamento,  abre-se um precedente perigoso.

No Direito Brasileiro seguimos a legislação escrita, principalmente em matéria penal.

Não somos como nos países de língua e cultura inglesas, em que se segue o precedente jurisprudencial, ao “stare decisis”, que dita as regras legislativas.

Por lá, as decisões dos tribunais tem força de lei, inclusive penal.

Todavia, de uns tempos para cá,  e sobretudo após o advento do Novo Código de Processo Civil,  em 2015, as decisões dos tribunais superiores passaram a vincular juízes e governos como se leis federais  fossem.

Criaram-se as súmulas vinculantes,  os temas de repercussão geral e a interpretação  ampliativa dos tipos penais pelos tribunais – o que nunca pôde. Assim é que a homofobia virou crime (não tem lei escrita para isso!).

Se o precedente da prisão de Cid por criticar a seus acusadores e juízes vira regra penal– e se é  que este é o motivo da prisão – cria-se no Brasil um precedente perigoso.

Qualquer juiz de qualquer rincão deste nosso imenso país vai poder fazer do mesmo.

Tomara que não seja só isso  – esperemos que revelem  o inteiro teor da decisão. Quando aprouver aos homens de toga lá de cima.

 

O dito pelo não  dito.
As únicas pessoas que realmente mudaram a história foram os que mudaram o pensamento dos homens a respeito de si mesmos”. (Malcom X, ativista politico americano).

 

Renato Zupo
Magistrado e Escritor

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