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RENATO ZUPO

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Culpa Grave

ENTRETANTO
Há um desacerto na lei penal brasileira, responsável por injustiças e gambiarras dos juízes e tribunais. Quando nosso Código Penal foi criado, na década de 1940, e com ele os conceitos de crimes dolosos e culposos, o trânsito daqui não era tão caótico e tampouco matava tanto como o faz hoje – trucidando famílias e jovens e fomentando mais lutos que em muitas guerras. Segundo o Direito legislado, se o crime é intencional se chama doloso e sua punição é mais rigorosa. No entanto, se o delito é não intencional, mas decorrente de imprudência, imperícia ou negligência, então se trata do crime denominado culposo, que é punido de maneira mais branda e raramente deflagra pena de prisão. Isso, no trânsito, em que quase nunca há crimes dolosos ou intencionais, gera uma impunidade atroz. O motorista bêbado, rachando um pega, drogado ou altamente imprudente, quase nunca vai preso porque não cometeu crime doloso, não agiu intencionalmente. Agiu “sem querer”. E com isso vai matando! A jurisprudência, que é o entendimento da lei pelos tribunais (trocando em miúdos) passou a adaptar a lei à necessidade dos nossos tempos e com isso entendeu que condutores muito irresponsáveis agiriam com dolo eventual – figura nova: agora o infrator não quer, mas assume o risco de gerar o resultado criminoso. E com isso poderiam ser considerados culpados por delitos mais graves e, via de consequência, punidos mais severamente. Talvez sensível a essas adaptações que tornam incerta a lei penal e desassossegam o estado democrático, porque há juízes que entendem assim, e juízes que não aderem a esse posicionamento, o legislador penal brasileiro criou recentemente a “culpa grave” para as infrações de trânsito. O crime é culposo, mas o condutor é tão lambão e irresponsável que vai para a cadeia. Vamos ver se funciona.
Valores.

Como sou um operador do Direito Penal que não acredita que o Direito Penal resolva todas as mazelas do mundo, creio piamente que colocar condutores criminosos na cadeia não vai resolver o problema do trânsito brasileiro. Se tem que ser feito, se tem que condenar e prender, façamos, mas podemos ir além, e não tratar o trânsito assassino diário que vivenciamos tão somente como um crime, e motoristas imprudentes apenas como criminosos. Podemos ir além. O sujeito é no trânsito, mostra ao dirigir, a educação que tem. Se não respeita os outros quando está pedestre, ao volante é que não irá fazê-lo. Se age como inconsequente na vida diária, não vai criar responsabilidades quando controla um automóvel. A noção de certo e errado, que chamamos na ciência de “discernimento”, é que é falha em nosso país, a começar por nossas famílias e escolas. Por falar nisso, em muitos países do mundo, o trânsito e a direção são ensinados como matérias regulares da grade curricular do ensino regular, como matemática e História. Não há impunidade, porque a fiscalização é eficiente, as polícias e órgãos de controle de trânsito, e os homens e mulheres que os incorporam, são bem pagos, respeitados e valorizados. Não existe leniência ou “jeitinho”. Mesmo em países em que o automóvel é uma opção, porque trens e aviões servem bem ao deslocamento urbano e de longa distância, essa alternativa é regrada e serve à coletividade. Nunca se pode sobrepor o interesse individual ao coletivo. Esses valores devem ser incutidos nas cabeças dos nossos jovens logo cedo, se não, continuaremos batendo recordes negativos de mortes e infrações no trânsito brasileiro.

Dirigimos mal.

Também é fato que o motorista brasileiro dirige mal, isso mesmo com três campeões mundiais de Fórmula 1 em nossa história. Dirigir não é pilotar. Há condicionantes por aqui que tornam pior nosso desempenho ao volante. Não temos intempéries naturais, e assim não sabemos dirigir sob intensa chuva, nevasca ou com gelo na pista. Nossas estradas são ridículas, e assim não podemos correr quando queremos ou precisamos correr. Há caminhões demais, porque há trens de menos, e assim sofremos em pistas simples e repletas de curvas que não permitem ultrapassagens seguras. Transgredimos no trânsito, também, porque aprendemos a dirigir em autoescola ou infringindo a lei e pegando carro escondido. Na autoescola aprendemos tarde demais, na clandestinidade aprendemos a fazer errado. Problemas simples, mas até aqui insolúveis.

Perguntar não ofende.
Alguém duvida que seja impossível seguir à risca o Código de Trânsito Brasileiro na saída da escola dos filhos?
O dito pelo não dito.
“Pecar pelo silêncio quando se deve protestar transforma o homem em um covarde” (Abraham Lincoln, Presidente Americano).
Renato Zupo,
Magistrado e Escritor

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