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RENATO ZUPO

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Copiando a América

ENTRETANTO

Nos Estados Unidos o cidadão flagrado preso vai imediatamente avistar-se com um magistrado que irá determinar sua custódia ou libertá-lo, com ou sem fiança. Isso por lá é imediato, mesmo. Aqui no Brasil e desde a assinatura do Pacto de San José da Costa Rica, ainda em 1992, essa conduta também seria obrigatória. No entanto, a \”apresentação imediata\” passou a ser tratada como \”comunicação\” da prisão do suspeito. Ou seja, não é o detento que se apresenta in corpore ao magistrado, mas sim papelada que é remetida ao juiz. E nem é tão imediato assim: são vinte e quatro longas horas para que ocorra. Um dia preso, sem que um juiz criminal saiba dessa prisão! E, ao saber, o que chega ao judiciário é um frio auto de prisão em flagrante com a narrativa unilateral da prisão. Até o final do inquérito é só o Estado-polícia que fala e que tem vez e voz.

A polícia americana é una e não se subdivide em civil e militar. Trabalha para o Promotor de Justiça, lá sem a mesma representatividade e o mesmo pacotão de atribuições que os representantes do Ministério Público brasileiros detém. Nossa polícia civil era a polícia judiciária, do juiz, condição que minguou até a Constituição de 1988, quando rompido em definitivo o vínculo entre as instituições. Bom para os policiais, péssimo para os juízes, que perderam seu poder armado e hoje precisam pedir benção a órgãos do Executivo para fazer cumprir suas decisões. No Brasil soa ridículo um poder da República sem coerção e sem força pública para impor a eficácia de seus comandos.

Não é só no processo que brasileiros e americanos do norte discrepam, com leis e princípios penais antagônicos. Por lá a gravidade do crime varia conforme a periculosidade do infrator. Já nosso cidadão é mais ou menos punido de acordo com a potencial lesividade de sua conduta, conforme possa ou não causar danos ao semelhante ou à sociedade. A periculosidade do indivíduo não é sopesada pelo aplicador da pena no momento da condenação e nem é circunstância definida em lei e que possa redimensionar as reprimendas penais.

Isso muda tudo na hora de aplicar o Direito. Me recordo de um case, como os gringos dizem, em que um atirador de elite da polícia americana mirou um seqüestrador que mantinha cativo um refém inocente. Ao atirar, porém, errou e matou a vítima indefesa. Aqui no Brasil seria punido o policial, condenado por homicídio culposo, perderia a função pública, seria enxovalhado pela mídia, etc… Lá fora, e sob as bênçãos de um Direito mais justo, foi punido o bandido que criou o risco da morte do refém. Em outro caso que estudei, três estudantes bêbados suprimiram placas de trânsito que sinalizavam uma interrupção de tráfego. Por conta desta perigosa travessura, um motorista colidiu seu carro e caiu em um rio, morrendo afogado. Os vândalos americanos pegaram penas de no mínimo dez anos de reclusão. No Brasil estariam pagando cestas básicas para instituições beneficentes, porque não queriam matar o motorista e porque sua conduta não teria significado um nexo causal, uma relação imediata de causa e efeito, geradora da morte de um semelhante.

A imposição da pena na justiça americana é bem diferente da nossa: o juiz estadunidense estipula um lapso temporal mínimo de pena restritiva de liberdade e o que ocorrer dali em diante dependerá do bom comportamento carcerário do criminoso. Aqui a pena é imposta integralmente, mas vai sendo comutada, diminuída, por força de trabalho carcerário e regalias, até se tornar irrisória. Em nosso país, é possível matar um semelhante, passar um mísero ano dormindo em um albergue, depois prestando serviços comunitários e é só. Bom negócio para o delinqüente, não?

O Direito americano é calcado todo nas decisões dos tribunais. Há regras básicas, simples e poucas, e o resto são os cases. Não há essa enxurrada de leis extravagantes e de códigos prolixos, todos ineficientes, e que não conseguem prescrever todos as nuances e condutas da vida humana. Por isso as lacunas, os erros e omissões que causam injustiças e impunidade, que travam o Estado Brasileiro e ferem nossa sociedade. Precisamos aprender a copiar o que é mais moderno e eficiente, já que sempre nos faltou originalidade legislativa. É imperiosa a necessidade de modificação de todo o Direito Penal nacional, desde os seus fundamentos básicos até suas regras processuais que deveriam dinamizar e agilizar a aplicação da lei, e não engessar o trabalho do operador do Direito, seja ele juiz, promotor, delegado de polícia ou advogado.

 

Renato Zupo,
Magistrado e Escritor

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