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RENATO ZUPO

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Roubando e matando

ENTRETANTO

Já se escreveram compêndios e mais compêndios, tribunais muito divergiram e teorias foram criadas para explicar e discutir a natureza e a diferença dos crimes de homicídio e latrocínio. Em ambos, morre a vítima pela ação do criminoso, mas no crime de latrocínio (latros em latim é ladrão, corruptela de roubo) o agente delinqüente visa o patrimônio da vítima. Ou seja, para roubar, mata. Já no crime de homicídio, o que o criminoso pretende desde o início é a morte da vítima. Se em decorrência dela se apossa de algum pertence de sua presa, isto por si só não tornará o crime contra a vida um latrocínio. Simples até aqui, mas aí os doutos começaram a complicar, querendo explicar a diferença entre o agente que mata roubando e o agente que rouba matando. A discussão é desnecessária. Se subtraio bens da vítima, ou tento fazê-lo, e disto decorre sua morte, pretendida ou não por mim, o que cometi foi um latrocínio. Ao contrário, se pretendia matar e matei, e não visava o patrimônio da vítima, cometi um homicídio. A diferença é sutil e dela decorre uma encruzilhada de tratamentos processuais distintos. Enquanto o latrocínio é julgado por um juiz singular, togado, um magistrado profissional, o homicídio é submetido ao julgamento da sociedade, através de um conselho de sentença composto por jurados, cidadãos escolhidos do povo da comarca para colaborar democraticamente na administração da justiça. Além disso, o homicídio poderá ou não ser crime hediondo, daí decorrendo benefícios ou prejuízos para o assassino condenado. Já o latrocínio será sempre crime hediondo e, desta forma, seu autor será inevitavelmente alvo de um cumprimento de pena exasperado e rigoroso, como deve ser. Por um homicídio, o agente condenado pode cumprir uma pena mínima de seis anos de reclusão, evoluindo para o meio livre ao cabo do cumprimento de um sexto da reprimenda . No latrocínio a pena mínima é de vinte anos de reclusão, altíssima, e seu autor deverá cumprir ao menos dois quintos da íntegra da condenação para retornar paulatinamente ao meio livre.

A morte no latrocínio.
O crime de latrocínio é intencional (doloso) no que se refere ao evento principal visado pelo agente, que é a subtração, a tomada de bens da vítima. É desnecessário que queira também matá-la. Se do roubo decorre a morte da vítima, há o latrocínio, ainda que este resultado (morte) seja acidental. Desta forma, comete o delito de latrocínio o cidadão criminoso que rende a vítima a mão armada e, diante da reação desta última, nela atira (e mata) para se defender e garantir sua fuga. O crime será idêntico ao do ladrão que, com a vítima já rendida, friamente a executa por maldade ou para evitar uma superveniente delação. Ainda se tratará de latrocínio quando o agente colide veículo em fuga, no acidente matando a vítima. Isto porque o latrocínio nada mais é que um crime de roubo agravado pelo resultado morte, não se exigindo dolo (intenção) do agente quanto a este resultado, que serve apenas para exasperar, para agravar a pena. Caso curioso ocorreu em Uberaba: o ladrão ingressou na casa de uma anciã para roubá-la. Acabou encontrando-se inesperadamente com ela no interior da habitação e a idosa, cardíaca que era, caiu dura para trás mortificada por um infarto fulminante. Ainda neste caso extremo é obrigatório admitir o latrocínio, porque em decorrência do roubo pretendido, morta a vítima. A intenção, o dolo exigido do agente é tão somente aquele de roubar, não se indagando da intenção de exterminar a vítima – elemento desnecessário para a configuração de tão grave delito.

Latrocínio tentado.
Agora os tribunais se debatem pela existência, ou não, do denominado latrocínio tentado. Por se tratar de um crime de roubo agravado pelo resultado, ainda que não pretendido pelo agente, pode parecer estranha a admissão de que o agente criminoso “tentou” praticar o latrocínio ao atirar na vítima do roubo e errar o alvo. No entanto, a inadmissão desta hipótese tornaria impune a esta ação, causadora de intensa reprovabilidade social. Talvez por este motivo a jurisprudência venha abraçando a tese da existência da tentativa em delitos “preterintencionais”, que são aqueles com a conduta pretendida e com o resultado fortuito, culposo e não querido pelo agente. O futuro, pouco a pouco, vai sedimentar uma posição segura sobre este dilema jurídico.

 

Renato Zupo,
Magistrado e Escritor

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