Sempre fui um lambão em habilidades manuais. É como se tivesse duas mãos esquerdas, eu que sou destro, isso desde a infância e quando não conseguia colorir ou recortar ou ter boas notas nas aulas de caligrafia. Na adolescência me tornei um perna de pau no futebol que sempre adorei e tinha certa dificuldade em correr com alguma elegância: parecia um polichinelo hesitante e caricato quando me apressava para atravessar uma rua ou simplesmente evitava a chuva no meio das calçadas repletas de gente e com falta de marquises, algo tão comum nas grandes cidades. Dançar? Tentei na adolescência como uma forma desesperada de sobrevivência sexual, mas sempre fui ridículo em ensaiar passos de qualquer ritmo. Dançando, parecia um pajé trôpego agitando-me para chamar chuva. No exército até que era bom de tiro, mas levava horas montando e desmontando fuzis e pistolas, geralmente ao som dos berros do sargento do meu pelotão, e quando quase sempre não conseguia em tempo razoável era punido com pernoites e detenções na caserna. Engraçado foi para tirar carteira de motorista. Como nasci e cresci em cidade grande, em bairro central, não tinha como aprender com meu pai em ruas vicinais, roças ou vilarejos. Sobrou-me a autoescola, e sofri e paguei e encarei cento e dezenove aulas de direção até ser aprovado e retirar minha CNH tão sonhada e depois comemorada. Até hoje as pequenas tarefas domésticas do meu lar são delegadas à minha esposa, e montar aqueles brinquedos de lego para os filhos.
Renato Zupo,
Magistrado e Escritor