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RENATO ZUPO
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Prisões

DIREITO PENAL MÁXIMO

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Vinte anos ou mais se passaram desde que a pequenina Miriam Brandão foi seqüestrada e morta por conhecidos de seus pais, os irmãos William e Wellington Gontijo. Asfixiada, queimada e enterrada, seus restos mortais tiveram que ser reconstituídos em uma época em que pouco tecnologia havia para a detecção do DNA de cadáveres calcinados e em decomposição. Processados ambos, foram condenados a penas que orbitaram medianamente entre o mínimo e o máximo previstos em lei e já devem estar ambos gozando de sua plena liberdade, enquanto a infeliz menina permanece morta, inexoravelmente morta, na flor dos seus sete aninhos de tenra vida e para desespero eterno de seus pais.

Vamos agora lembrar de outro caso famoso: o assassinato da atriz Daniela Perez, tão contundente que modificou a lei penal para também considerar crime hediondo o homicídio qualificado. Pouco importa que depois disso os juristas e tribunais do país tenham fatiado a Lei de Crimes Hediondos a seu bel prazer e por questões de política criminal, mas que o crime assustou e conseguiu modificar ainda que só um pouquinho o trato criminal de delito grave, como costumeiramente ocorre por aqui em prática que torna o Direito Penal brasileiro uma ciência sempre divisada pela ótica dos míopes e daltônicos. Neste caso, a atriz foi assassinada por outro ator, Guilherme de Pádua, e pela esposa deste último. Morta a tesouradas. E o sujeito teve a cara de pau de comparecer ao velório e enterro da moça para salvar as aparências e fingir-se inocente. Qual a pena deles? Digamos que em menos de uma década estavam todos dois soltos, leves, cada qual seguindo sua vida e ninguém mais se lembra ou chora pela infeliz vítima morta no auge da fama, do talento e da beleza.

Temos que parar urgente com essa mania de tentarmos nos aproximar do primeiro mundo com um complexo de vira latas que possuímos e achamos que sendo bonzinhos e alvissareiros com criminosos estaremos contribuindo para sua ressocialização, porque é assim nos países europeus, e etc… Não é assim nos países europeus, é a primeira coisa que deve ficar bem clara aqui. Por lá se pune com reclusão, e com rigidez, crimes muito menos graves do que os retratados aqui. O gargalo que há aqui e que não há lá é que por aqui nosso sistema penitenciário é próprio para animais em jaulas, e lá é voltado para a recuperação e readequação social do criminoso condenado. Fora isso, aqui se dá muito pouca pena, muito pouco castigo, e direito sem coercibilidade não é direito, vira regra de boa educação, moral, religiosa. Enfim, algo que não impõe e nem previne. Cadeia, pena, punição, castigo, tem que dar medo, tem que intimidar, tem que doer. Depois da punição, o cumprimento da pena é outra coisa: vamos todos lutar para que seja digno. Mas impedir a punição eficiente e suficiente por conta de falsos truísmos, premissas, e uma visão distorcida do direito comparado é, antes de tudo, sinal de uma ignorância leviana – própria daqueles que não conhecem o funcionamento do mundo, ou somente o conhecem através das telas de TV, e saem por aí bravateando experiências e teorias que só servem pra vender livros e criar teses mirabolantes que não são eficientes no trato com a criminalidade cada vez mais assustadoramente crescente no país.

Para terminar, exemplifico que o pasmo e a sensação de absurdo não é só minha, mas de muito jurista conhecido e bom. O caso da menina Miriam Brandão, por exemplo, contado no começo destas linhas, foi dissecado no voto do bravo Ministro Francisco Rezeck, que convém reproduzir para que os leitores vejam que não é só uma voz isolada que berra por justiça mais punitiva neste país de cordeiros a mercê de lobos. Com a palavra, o Ministro Francisco Rezeck: …. O país todo recordará a sentença proferida no foro de Belo Horizonte sobre o seqüestro de uma criança, de uma menina, que ato contínuo foi assassinada e enterrada em cova rasa, apurando-se logo em seguida, mediante trabalho competente da polícia, a autoria. Ao final fixou-se a pena, e há de ter-se então homenageado o esforço da defesa, situando-a em algo pouco acima do ponto médio entre máximo e mínimo. A mãe da vítima, falando à imprensa a respeito do que achara da sentença, parecia fortemente motivada a endereçar uma pergunta aos juízes do Brasil. Se naquele caso não se aplicava a pena máxima, ela, a mãe, como inúmeros cidadãos de boa fé, quereriam saber da instituição judiciária qual era o caso de pena máxima; ou se a pena máxima é apenas um delírio do legislador, fadado a não existir na realidade objetiva…” (RTJ 174/523, HC 72.795-MS, Relator Ministro Maurício Correa, Relator para o Acórdão, Ministro Carlos Velloso, Voto do Ministro Francisco Rezek).

 

Renato Zupo,
Magistrado e Escritor

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