O Supremo não erra nunca, dizia meu velho pai, tão somente porque é o último a julgar, de suas decisões não cabe recurso a qualquer outra instância, porque instância superior ao STF não há. É verdade. Então, se pode lamentar, lastimar, questionar as decisões de nossa Suprema Corte. Não se pode é descumpri-las ou querer lhes negar vigência – como muitos do PT o fazem depois da prisão de Luís Inácio Lula da Silva. O jurista Saulo Ramos narrou em “O Código Da Vida”, seu esplêndido livro autobiográfico, cinquenta anos de advocacia junto aos poderosos, de Jânio Quadros a Fernando Collor. Em determinado trecho do livro conta outro julgamento histórico do STF, à época composto obviamente por outros membros – estamos falando de trinta anos atrás. O advogado saiu derrotado do plenário com o revés experimentado. Derrotado, frustrado e assustado com o teor da decisão, que negava direitos óbvios sem qualquer argumento lógico. À saída do plenário se deparou com uma turba numerosa de jornalistas barulhentos querendo ouvir dele a impressão sobre a decisão. Queriam, na verdade, sangue, reclamos e palavrões, que é o que vende jornais. Saulo não titubeou: disse que a decisão era respeitável, que iria examiná-la e escolher o recurso cabível (que não havia e nem há). Não deu chance alguma aos que esperavam por alguma intriga institucional. E explicou no livro que foi elegante em suas evasivas porque não se desrespeitam os poderes constituídos, não se menospreza a democracia e nem se ataca o sistema. O operador do Direito trabalha com a lei, e não contra ela.
Merecimento.
Saulo Ramos, é fato, não experimentou atuar sob a presidência de alguns dos ministros que aí estão e que talvez não lhe mereçam a ética e a educação de tempos tristemente idos. Hoje, acredito que perderia a fleuma e desceria do pedestal de sua cortesia para ser um pouco mais ríspido. Jamais, no entanto, faria deboche, chacota, ou ofenderia a honra de um magistrado simplesmente porque decidiu como decidiu, conforme entendimento razoável ou interesse suspeito que seja. Se juiz não pode ter correligionários, e não pode definitivamente, também não pode ser culpado e execrado por suas decisões. É hora de repensarmos nossa conduta brasileira, única no mundo, de menoscabar os poderosos simplesmente porque estão no poder, de confundir liberdade com arrogância e a revolta justa com o ímpeto agressivo da falta de educação eviscerada em redes sociais e nas ruas. Só perdemos com isso. Não se ganha nada com calúnias, ofensas e baderna.
Desaprendendo.
Quando morreu um dançarino do programa “Esquenta” de Regina Casé, da Globo e que graças a Deus saiu do ar, a imprensa em peso crucificou os policiais participantes de uma operação em certa favela carioca e que teriam, segundo as más línguas, assassinado covardemente ao inocente artista. Depois o pobrezinho foi descoberto em fotos e em vida, pela internet, exibindo um fuzil Ak e sorrindo para as câmeras que não eram da Globo, mas de sua facção criminosa. A imprensa calou-se. Em seguida foi a vez de uma aluna que jogava Vôlei em uma escola do Rio e que foi vítima de saraivada de balas – novamente imputadas a policiais. Descobri através de um amigo jornalista que a moça era irmã de um traficante líder de facção criminosa, envolvido justamente naquele tiroteio. Sobre isso a imprensa também se calou. Agora é a vez da vereadora Mariele: teria sido executada porque defende minorias, é negra, feminista, lésbica, etc… As investigações não avançaram muito até aqui, mas as grandes mídias já descobriram que a história toda está muito mal contada e até agora não conseguiram responsabilizar nenhum policial. Acho que talvez por isso estejam tão quietos. Isto porque o inquérito que apura o homicídio de Mariele, assim como qualquer outro procedimento investigatório, não tem obrigação alguma de chegar a um final feliz ou midiático, mas sim e tão somente descobrir a verdade, doa a quem doer. A mídia não aprende em suas conclusões precipitadas. Ao contrário, desaprende.
O Código Fux.
O novo Código de Processo Civil (CPC), já não tão novo assim, foi batizado como Código Fux porque um de seus idealizadores é justamente o ministro homônimo do STF. Estudei de cabo a rabo o novo diploma legal, tergiversei, mas não adianta, cheguei à inexorável conclusão que ele não ajuda em nada na celeridade processual, não diminui o número de recursos, não acelera a tramitação das ações e nem impõe eficácia e efetividade jurisdicional às decisões. Não como deveria. Esperamos tanto tempo por nada.
O dito pelo não dito.
“Algumas pessoas mudam de partido em defesa de seus princípios. Outros mudam de princípios em defesa de seu partido.“ (Winston Churchill, político inglês).
Renato Zupo,
Magistrado e Escritor