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RENATO ZUPO
RENATO ZUPO

Magistrado • Escritor • Palestrante

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Ainda no nordeste

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Ainda viajando para divulgar nosso projeto cultural, estive no Pelourinho e no seu complexo turístico que inclui o elevador Lacerda e o Mercado Modelo, além de um amplo casario antigo que descortina para a belíssima Bahia de todos os santos, que dá nome ao estado e é, com certeza, a parte mais bonita (ou a única parte bonita) de Salvador. O Pelourinho é bastante agitado e tem vendedores bastante agressivos, que correm para te mostrar miçangas e quase te obrigam a comprar fitinhas do Senhor do Bonfim. A área já foi palco de muito crime mas, atualmente, se encontra videovigiada, com câmeras de segurança pulverizadas por todo o local. A culinária baiana continua deliciosa, apesar do azeite de dendê e do leite de coco que não são unanimidades, mas o melhor de tudo é visitar o Museu Casa de Jorge Amado, em pleno Pelô. Para um intelectual, um escritor, então, é um sonho. Jorge Amado, acredito, foi um dos grandes romancistas da literatura mundial, sem exagero algum, até porque não sou e jamais fui um nacionalista. Sou, ao contrário, cético e crítico com o que denomino nossa literatura \”de raiz\”, porque acho que escritor de verdade não deve escrever para sua aldeia, mas para o mundo. E Jorge Amado o fez com maestria. Se não vivesse segregado pela língua portuguesa que é belíssima mas nos isola do resto do mundo, seria ovacionado e cantado em prosa e verso muito mais do que já o foi (ou é), porque sua literatura é imorredoura. Preocupava-se em entreter, o que deve fazer todo bom escritor, e o fazia com classe e uma arte e uma baianidade únicas. Era singularíssimo e extremamente original. Que tristeza me deu quando, certa feita conversando com uma professa de português, esta me segredou detestar Jorge Amado por conta dos \”palavrões\” contidos em seu texto… Ora, meu Deus, falar sobre Bahia e baianos e não falar de palavrões é o mesmo que omitir as montanhas das Minas Gerais. E olha que temos, nós brasileiros, um trato muito pudico e antiquado com o palavrão, utilizado com muito mais desenvoltura e sem puritanismos e nem moralismos absurdos em vários outros países desenvolvido do mundo. O palavrão, na França, por exemplo, é incorporado à língua deles, e não é feio pronunciá-lo. Jorge Amado é grande, e o termo \”imortal\”, que ganhou ao ser eleito para a Academia Brasileira de Letras, nunca soaria tão adequado antes ou depois de sua posse. Ele representa uma época de verdadeiros romancistas brasileiros que encantavam: ele, Érico Veríssimo, Guimarães Rosa, e o grande (e hoje esquecido) José Mauro de Vasconcelos. Quem dera ainda os tivéssemos produzindo hoje, entre nós vivos.

Bahia x Nordeste.
Há um movimento meio separatista, e bem pitoresco, na política baiana e que começa a impregnar o cenário nacional, visando retirar o estado da Bahia do Nordeste e inseri-lo no Sudeste, segundo alguns muito mais adequado ao perfil econômico e social do estado de Jorge Amado, Caetano, Bethânia e João Gilberto. Não sei se é um status tolo, porque imagino que (para o nordestino) seja um orgulho ser nordestino. É fato que a Bahia é bem diferente do restante da região, a começar pelo sotaque, que não é igual ao de um pernambucano ou cearense, por exemplo. Confundir um baiano com um sergipano é o mesmo que confundir um gaúcho com um paranaense, ou um paulista com um mineiro. Isto aos olhos e ouvidos dos nordestinos. O baiano também é mais \”esperto\” no mau sentido. Por lá consumimos na beira mar três cocos e o vendedor, burro e ladrão, nos cobrou \”vinte reais\”, esquecendo-se que a conta jamais poderia sair exata. Não reclamei para não perder a piada e nem o \”causo\” em homenagem a vocês, meus leitores. E no aeroporto de Salvador? Ali, houve o inusitado: uma moreninha se aproximou e me pediu dinheiro para \”inteirar\” uma passagem (aérea!!!) para Feira de Santana. Realmente, os aeroportos estão cada vez mais parecidos com rodoviárias, para o bem e para o mal. De qualquer modo, e ainda que a Bahia seja bem diferente do resto do Nordeste, também é diferente do Sudeste e do resto do país. A Bahia é a Bahia, e pronto, e não há nada igual a ela, como dizia outro grande escritor daquelas bandas, meu ídolo João Ubaldo Ribeiro.

O grande lance.
A melhor coisa de espalhar cultura pelo país é também se abeberar da cultura local, é também aprender, ao invés de só ensinar. Mesmo na terra do Olodum e do Axé, vi pessoas sofisticadas querendo cultura cosmopolita. Mesmo aqui, na terra do sertanejo e do rodeio, há pessoas interessadas em conhecer um pouco das linguagens urbanas de nossa literatura. Não há como criar nichos culturais no Brasil, que é miscigenado até nos seus saberes e sabores locais.

 

Renato Zupo,
Magistrado e Escritor

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